quarta-feira, 29 de março de 2017

Tese ao 6º Congresso do PT: A Esperança É Vermelha – Brasil Urgente, Lula presidente!!!


Esta é a tese apresentada pela tendência petista Articulação de Esquerda ao 6º Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores.

A inauguração popular da transposição do rio São Francisco, o Dia Nacional de Mobilização e Paralisação contra o fim da aposentadoria e o Dia Internacional da Mulher são os exemplos mais recentes a confirmar qual é o nosso caminho: a mobilização da classe trabalhadora brasileira em defesa dos direitos ameaçados pelo golpismo, a luta pelo Fora Temer e por Diretas Já, a conquista de um novo governo encabeçado pelo presidente Lula, acumulando forças para um Brasil democrático-popular e socialista.

Não é um caminho fácil. O Brasil vive uma profunda crise econômica, social e política. A principal causa desta crise é a ação das forças golpistas, que desde 2011 até hoje implementam uma ofensiva contra Dilma e Lula, contra o PT e o conjunto da esquerda política e social, contra os avanços ocorridos no país a partir de 2003, contra os dispositivos sociais da Constituição de 1988, contra a Petrobrás e contra a Consolidação das Leis do Trabalho, contra os direitos do povo, contra as liberdades democráticas, contra a soberania nacional, contra a integração regional e contra nossa participação nos BRICS.

Não vivemos tempos fáceis para quem defende a democracia, o bem estar social, a soberania nacional e o socialismo. A crise no Brasil coincide com a ofensiva da direita na América Latina e Caribe, com o crescimento do populismo de direita na Europa e nos Estados Unidos, com a crise econômica mundial e com as ameaças de guerra. Nestes tempos, só há uma saída para a classe trabalhadora: a organização, a mobilização e a luta. Nestes tempos, só há um lugar para o Partido dos Trabalhadores: com a classe trabalhadora e a maioria do povo brasileiro. Razão de ser de sua criação e existência.

A nosso favor, um fato cada vez mais evidente: o governo golpista de Temer é frágil e impopular. Mas o golpismo vai muito além do usurpador: tem apoio do grande empresariado, dos grandes meios de comunicação, da cúpula do judiciário e da alta burocracia de Estado, dos partidos de direita, da maioria do Congresso Nacional –como se viu na votação da “terceirização”. A crescente insatisfação popular, alimentada pelo envolvimento dos golpistas com todo tipo de corrupção, leva aqueles setores a discutirem alternativas, entre as quais substituir Temer por um presidente eleito indiretamente pelo Congresso Nacional, adotar o parlamentarismo e impedir Lula de disputar a próxima eleição presidencial.

Contra o golpismo, contra o governo ilegítimo e também contra todo tipo de “golpe dentro do golpe”, nossas respostas são:

Nenhum direito a menos: organização, mobilização e luta da classe trabalhadora, combinando lutas setoriais com a greve geral, para defender os direitos ameaçados pelo programa golpista. Esta é a principal tarefa da Frente Brasil Popular e de outras organizações, da Central Única dos Trabalhadores e de outras centrais sindicais, da Central de Movimentos Populares e de outras organizações populares, do Movimento Sem Terra e demais movimentos camponeses, da UNE, UBES e todas as entidades estudantis e de juventude, das organizações de mulheres, negros e negras, LGBT e povos indígenas;

Fora Temer, Diretas Já: não reconhecemos a legitimidade do governo golpista. Defendemos a antecipação imediata das eleições presidenciais. As medidas golpistas devem ser revogadas pelo governo legitimamente eleito;

Brasil urgente, Lula Presidente: início imediato de uma mobilização nacional para que Lula volte a governar o Brasil, sustentado por uma frente popular vertebrada pelos partidos de esquerda e pelos movimentos sociais, apresentando um programa de emergência para tirar o país da crise, revogando as medidas do governo golpista e implementando um programa de reformas estruturais.

No período 2017-2018 não ocorrerá o mesmo que ocorreu em 2001-2002. Prevalece na classe dominante a disposição de não permitir uma novo governo encabeçado por uma presidência petista. Apesar disto, o agravamento da crise política, social e econômica tende a produzir defecções e cisões no bloco golpista. Mas não se deve conferir a estas defecções um sentido estratégico. Como se viu entre 2003-2016, os diferentes setores da classe dominante não têm compromisso com um projeto de transformação social, não importando se através de reformas estruturais radicais ou através de políticas públicas gradualistas.  Por outro lado, aprendemos com a experiência de governar o Brasil: não basta melhorar a vida do povo através de políticas públicas. É preciso fazer reformas estruturais. Reformas que não serão apoiadas por nenhum setor da classe dominante Por tudo isso, nosso caminho para vencer e para governar depende de recuperarmos nosso apoio junto à classe trabalhadora, através da mobilização e da luta por um programa claramente de esquerda, numa demarcação política e simbólica muito forte com o golpismo, com o neoliberalismo e demais projetos conservadores, para que a classe trabalhadora – especialmente os setores críticos e descontentes conosco — perceba claramente as diferenças e se organize para defender as mudanças profundas que o Brasil necessita. Por tudo isto, podemos e devemos aproveitar as divergências existentes e que venham a surgir no interior do golpismo, mas sem nenhum tipo de ilusão ou concessão que prejudique nosso esforço principal: conquistar, dar coesão, colocar em movimento e luta a classe trabalhadora e as maiorias populares.

É possível derrotar e derrubar o governo golpista. É possível antecipar e vencer as eleições presidenciais. Mas nosso Partido e a esquerda brasileira não devem minimizar as dificuldades. Os golpistas usarão todos os meios — luta ideológica, luta política, repressão — contra a esquerda, para implementar o programa da “ponte para o futuro” e, principalmente, na operação de cerco e aniquilamento que movem contra Lula e o PT. O objetivo dos golpistas é vencer as eleições presidenciais de 2018, tentando assim legitimar o golpe e criar as condições para um longo período de hegemonia das forças reacionárias.

Por estas razões, os anos de 2017 e 2018 são fundamentais. Nesta janela de tempo, podemos obter uma importante vitória tática — derrotar e derrubar o golpismo, disputar e vencer com Lula as eleições presidenciais, criando as condições para retomarmos a ofensiva por um Brasil democrático-popular e socialista. Daí a importância de combinarmos, num só movimento, a luta em defesa dos direitos, o Fora Temer, as diretas já e a campanha Brasil Urgente, Lula presidente.

A candidatura, a campanha, a eleição e um novo governo de Lula são parte fundamental deste movimento. Motivo pelo qual os golpistas farão de tudo para impedir que Lula possa ser candidato, possa fazer campanha, possa vencer, possa tomar posse e possa governar. Não devemos descartar, por exemplo, manobras como a eleição indireta de um substituto para Temer e/ou a adoção do parlamentarismo. A campanha Lula, neste sentido, é também um instrumento importante para garantir a realização, o quanto antes, das próximas eleições diretas presidenciais. O crescimento do apoio à candidatura de Lula é, além disso, um fator que inibirá quem deseje interditar sua candidatura através de algum casuísmo jurídico.

Entretanto, o Partido e a esquerda brasileira precisam ter claro que a campanha, a eleição e um novo governo Lula não resolverão — por si só – lacunas programáticas que ficaram evidentes entre 2003 e 2016. Entre estas lacunas, destacamos a necessidade de uma Assembleia Constituinte, de derrotar a ditadura do capital financeiro sobre a economia nacional, de quebrar o oligopólio da mídia, de realizar uma reforma tributária e demais reformas estruturais. Tais lacunas poderão serão preenchidas apenas se houver um alto nível de consciência, organização e mobilização popular e de esquerda; e se mudarmos a relação entre o governo, a mobilização popular, o legislativo, o judiciário e os meios de comunicação.

Este é o maior desafio do 6º Congresso do Partido dos Trabalhadores: realizar um 6º Congresso Nacional capaz de analisar o cenário internacional e nacional, fazer o balanço dos governos nacionais petistas, formular uma nova estratégia política e um novo programa, alterar o funcionamento do PT e nossa organização partidária, precisar nossa tática frente ao governo golpista e em defesa dos direitos do povo brasileiro, nossa relação com os diferentes setores democráticos, populares e de esquerda. Uma orientação estratégica capaz de apontar novos caminhos para derrotar a direita, para recuperar o apoio da classe trabalhadora, para atuar na nova situação criada no país, na América Latina e no mundo. Uma orientação estratégica que explique porquê um governo eleito em condições tão difíceis precisa ser capaz de fazer mudanças mais profundas do que as feitas entre 2003-2016; e apontar como isto pode e deve ser feito. Noutras palavras, o 6 Congresso do Partido dos Trabalhadores precisa ser capaz de apontar qual campanha Lula e qual Partido dos Trabalhadores são necessários neste momento histórico.

Ao realizar o 6º Congresso, o conjunto do PT e dos petistas tem plena consciência de suas responsabilidades. Assim como fomos depositários de imensas esperanças, também fomos causa de imensas frustrações. O debate congressual é momento de separar o joio do trigo, combinar crítica e autocrítica, reconhecer nossos erros e reafirmar nossos acertos. A análise crítica da experiência dos últimos anos e décadas serve tanto para corrigir os erros quanto para aperfeiçoar e aprofundar os nossos acertos. Certamente haverá, entre nossos inimigos e adversários, quem buscará se aproveitar desta ou daquela frase para atacar nosso Partido. Não importa: quem está seguro da justeza de sua luta, não teme a autocrítica. Ademais, reconhecer os erros e ajustar contas com práticas e concepções errôneas é, para um partido de esquerda, um processo de aprendizagem coletiva, algo que devemos à classe trabalhadora, ao povo brasileiro, às gerações que lutaram antes de nós e especialmente às que virão.

O 6º Congresso do PT não é um ponto final; é uma etapa importante do processo que levará a classe trabalhadora, as forças populares, democráticas e de esquerda, a governar novamente o Brasil e a fazer disto um ponto de apoio de nosso caminho para o poder. Aos amigos que dizem que “passou o tempo do PT”, respondemos com paciência: se isto fosse verdade, a classe dominante brasileira não teria como a maior de suas prioridades atacar e tentar destruir nosso Partido. Aos inimigos que pretendem nos destruir, contestamos com vigor: como de outras vezes, a esquerda brasileira saberá dar a volta por cima e retornar mais forte e comprometida com a luta por uma sociedade sem opressão nem exploração, o socialismo.

Defender o povo e derrotar o governo golpista

O golpe de 31 de agosto de 2016 não foi contra Dilma, nem contra o PT: foi contra o povo brasileiro. Prova disto é que o golpismo ataca salários e direitos; agride e ameaça as liberdades e conquistas democráticas; além de subordinar a política externa brasileira aos Estados Unidos, nos afastando da integração regional e dos BRICS.

Os golpistas tentam anular os aspectos positivos da Constituição de 1988, em especial o ensino público e gratuito em todos os níveis, o Sistema Único de Saúde (SUS), a Assistência Social e a Previdência Social e Universal. Querem privatizar a Petrobrás e entregar as reservas do Pré-Sal de mão beijada para petrolíferas estrangeiras. Pretendem destruir os avanços econômicos, políticos, sociais e culturais iniciados em 2003. Com a reforma trabalhista, tentam até mesmo desmontar a legislação social que vem dos anos 1940. Com a aprovação da Emenda Constitucional nº 95 (ex-PEC 241 e 55), querem congelar por duas décadas o investimento social, impedindo qualquer tipo de política de distribuição de renda e bem-estar através de políticas públicas.

O golpismo repercute nos programas de ajuste e repressão adotados por governos estaduais e municipais, na atividade legislativa nos três níveis, na ação de diversos instrumentos e aparatos estatais e paraestatais, com destaque para os parlamentos, as polícias, o judiciário e os meios de comunicação.

O golpismo produz efeitos no plano das ideias, da cultura, da comunicação, da educação e da religiosidade, num sentido reacionário que está presente também em outras regiões do mundo. O golpismo ataca a classe trabalhadora e o conjunto dos setores populares, as mulheres, a juventude, os negros e as negras, os aposentados, as LGBTs e os povos indígenas. Determinadas regiões do país e determinadas categorias são atingidas primeiro e mais duramente. Entre as principais vítimas estão as mulheres, não apenas no plano econômico e social, mas nos direitos básicos, inclusive no direito à vida.

Os golpistas não se iludiram com os resultados das eleições municipais de 2016. Sabem que sua política de recessão gera um crescente descontentamento popular. Para retardar, enfraquecer e tentar impedir que este descontentamento produza uma alternativa de governo, os golpistas dobram a aposta na política de repressão. É neste contexto que ocorrem os ataques aos Sem Terra e Sem Teto, os ataques contra a juventude que ocupa escolas, os ataques ao movimento sindical, ao PT e a Lula. Alguns destes ataques não são feitos apenas por aparatos estatais: em vários casos, registra-se a presença de grupos de direita, alguns com composição predominantemente juvenil e com características paramilitares. Estas ações e o entorno ideológico constituem um dos sinais de que há um clima crescente de “fascistização” na sociedade, que deve ser enfrentado com todas as energias. Não se derrota o fascismo com bons modos!

A criminalização da esquerda é, no fundamental, um prolongamento da criminalização da pobreza, dos negros, das periferias.  Neste sentido, o que alguns denominam de “Estado de exceção” é o “Estado realmente existente” para grande parte da população brasileira. Para o atual governo federal e seus aliados, a questão social voltou a ser “caso de polícia”. A repressão é um pressuposto e uma decorrência do regresso às políticas neoliberais claras e duras. Nosso Partido deve perceber que esta repressão utiliza, como ponto de apoio, o fortalecimento de determinadas corporações de Estado, medidas como a “lei antiterrorismo”, além de certas concepções acerca da judicialização, da penalização e da “república” que foram adotadas por nossos governos.

Vivemos uma situação semelhante à dos anos 1990: lutamos contra uma ofensiva neoliberal. Mas, semelhanças a parte, a situação é diferente em vários sentidos. O principal deles é que  o capitalismo brasileiro e o capitalismo internacional não são os mesmos dos anos 1990, tendo ocorrido mudanças importantes na estrutura de classes do Brasil, assim como na dinâmica do capitalismo global. Além disso, depois dos anos 1990 nós vencemos quatro eleições presidenciais seguidas e tivemos uma experiência de governo, o que mudou a percepção da classe trabalhadora a respeito do PT e da esquerda. Por fim, a classe dominante também aprendeu com nossa experiência. Num resumo: os conflitos serão mais rápidos e mais profundos do que antes.

Por todos estes motivos, não basta elaborar um novo programa, uma nova estratégia e táticas adequadas. É preciso mudar o padrão de conduta e organização do nosso Partido dos Trabalhadores. A situação exige, mais do que nunca, uma esquerda socialista e de massas, enraizada na classe trabalhadora, disposta a ser ao mesmo tempo alternativa de governo e de poder, com maior consistência ideológica, capacidade de comunicação, organização e disposição de luta.

A situação mundial

A elaboração da estratégia do PT deve levar em conta as principais características do atual cenário mundial: as crises, as guerras e a instabilidade generalizada. Estas características decorrem de um conjunto de fatores, surgidos em diferentes momentos da história recente, mas que hoje se conjugam na composição do cenário internacional.

Citamos entre estes fatores: a) a hegemonia sem precedentes do capitalismo no mundo, que nunca foi tão capitalista quanto é hoje; b) a natureza do capitalismo contemporâneo, altamente financeirizado e confirmando a tendência à concentração e centralização do capital; c) a profunda e duradoura crise do capitalismo, cujas causas não foram superadas, pelo contrário; d) o declínio relativo da potência hegemônica, os EUA, que perderam peso econômico, vivem uma crise interna de grandes proporções e tem sua hegemonia crescentemente contestada; e) a ascensão de outros polos de poder, produzindo uma situação mundial crescentemente multipolar, o que não significa necessariamente um mundo pacífico; f) a formação de blocos, acordos e tratados, sintomas de desarranjo e crise, não de ordem e estabilidade; g) a disputa entre diferentes vias de desenvolvimento capitalista, cabendo às alternativas socialistas uma pequena influência, pois estão mais fracas do que já foram antes; h) a defensiva estratégica da classe trabalhadora, com o aumento das taxas de exploração, redução na remuneração, piora nas condições de trabalho e reversão de direitos sociais.

As políticas neoliberais, hegemônicas em âmbito mundial desde os anos 1990, não foram interrompidas com a crise de 2008. Os grandes estados capitalistas fizeram uma profunda intervenção estatal, mas seu objetivo foi salvar o grande capital, sem alterar o padrão de acumulação. Este tipo de intervenção estatal impediu o colapso, mas às custas de uma ampliação da polarização social e política, assim como do aprofundamento das agressões imperialistas do consórcio formado pelos Estados Unidos, União Europeia e Japão contra a soberania nacional dos países economicamente mais frágeis. Estas agressões geram reações e alternativas de diferentes tipos e conteúdos. É o caso dos BRICS; dos governos progressistas e de esquerda na América Latina; das lutas políticas e sociais impulsionadas por forças de esquerda que atuam na Europa, África, Ásia e Estados Unidos. Mas também surgem respostas reacionárias, como o fundamentalismo terrorista e o populismo de direita, este último personificado em Donald Trump. Na Europa, fascistas, neonazistas e ultraconservadores ampliam sua força eleitoral. O neoliberalismo, o fundamentalismo terrorista e o populismo de direita conduzem, por diferentes caminhos, ao agravamento da instabilidade, das crises e das guerras.

Clamam no deserto aqueles que pretendem civilizar e humanizar o capitalismo e os capitalistas, tentando convencê-los de que poderiam lucrar mais se todos viverem melhor. Só as forças de esquerda, populares e democráticas têm condições de deter a contraofensiva reacionária que empurra o mundo para crises cada vez maiores e nos ameaça com guerras cada vez mais destrutivas. Para isto será preciso que a classe trabalhadora e seus representantes políticos percam todas as ilusões de que será possível defender o bem-estar social, as liberdades democráticas, a soberania nacional e uma nova ordem mundial, sem impor uma derrota profunda às forças capitalistas e a seus representantes políticos, sem oferecer uma alternativa global nova e radical.

Em 2008, a crise econômica teve como epicentro os Estados Unidos. Hoje, a crise política mundial também tem seu epicentro lá. A eleição de Donald Trump é um símbolo dos tempos em que vivemos no cenário internacional, que possui semelhanças inquietantes com o que ocorreu na crise dos anos 1930 e período entre guerras (1914-1945). Como naqueles tempos, não existe caminho do meio. As políticas de “ganha-ganha” são possíveis apenas quando tanto os de baixo quanto os de cima têm mais paciência que medo, mas principalmente quando há crescimento econômico que torne factível redistribuir renda. Mas quando não há crescimento econômico, quando há decrescimento, a luta é por fatias de um bolo que está diminuindo de tamanho. Então se estabelece uma luta pela expropriação, o medo toma conta e se fecham os “caminhos do meio”. Tampouco existe reforma pelo alto capaz de resolver a situação atual. As forças que causam a crise e que se beneficiam dela são as mesmas que dominam o poder político, econômico, militar e ideológico nos Estados Unidos. É por isto que as ações práticas do governo dos EUA ampliam a crise. A dinâmica da crise mundial é mais poderosa e tende a empurrá-los em direção à guerra.

A situação regional

A partir de 1998, teve início na América Latina e Caribe um ciclo de governos progressistas e de esquerda que, malgrado suas debilidades e diferenças, apontava no sentido da ampliação do bem-estar e da igualdade social, ampliação das liberdades democráticas, da soberania nacional e integração regional.

Até a crise internacional de 2008, os governos progressistas e de esquerda vinham conseguindo avançar, contornando seus limites, contradições e erros. Contudo, depois da crise ocorreu uma deterioração das condições políticas, econômicas e sociais, abrindo uma fase de contraofensiva reacionária que em vários países vem derrotando os governos progressistas e de esquerda, colocando na defensiva as forças sociais e partidárias vinculadas à classe trabalhadora e afetando instituições como o Mercosul, a Unasul e a Celac. Aonde a direita voltou ao governo – como na Argentina e no Brasil –, assiste-se a um retrocesso social, econômico e político, bem como a um giro na política externa, que volta a ser subalterna aos interesses dos EUA.

A esquerda latino-americana e caribenha está convocada a deter a ofensiva reacionária, reconquistar os espaços perdidos, alcançar novas vitórias, criar as condições para que a Unasul e a Celac voltem a ter protagonismo no cenário internacional, em favor da paz e de outra ordem internacional. Frente a uma nova situação estratégica, a esquerda da região está chamada, também, a produzir uma nova estratégia, que continuará a ter na integração da América Latina e do Caribe um de seus componentes centrais, acentuará sua natureza anti-imperialista e socialista. Afinal, vista de conjunto, a situação internacional torna ainda mais imprescindível e urgente nossa luta pelo socialismo. Não apenas pelos motivos já citados, mas também pelos impactos cada vez mais catastróficos que o capitalismo vem provocando em nosso planeta, com consequências que afetam terrivelmente as condições de vida da classe trabalhadora, a natureza e o conjunto da humanidade.

Um programa democrático, popular e socialista

Paradoxalmente, a mesma situação internacional que favoreceu o golpe, não ajuda os intentos do governo golpista, que defende um neoliberalismo radical e um alinhamento carnal com os EUA, num momento em que isto produz muitos ônus e não produz os “bônus” que beneficiaram o primeiro mandato tucano (como, por exemplo, o grande volume de recursos atraídos pelas privatizações daquela época, recursos que foram essenciais para a tão badalada “estabilidade monetária”, com efeitos deletérios que se fizeram sentir ao final do primeiro mandato e durante todo o segundo mandato de FHC). Os golpistas já perceberam que o cenário internacional não é o que esperavam, a começar pelo resultado das eleições presidenciais dos EUA. Mas até agora sua reação vem sendo a de insistir na “ponte para o futuro”, radicalizar programaticamente, anunciando e buscando promover retrocessos, solapar direitos e alienar nossa soberania, numa profundidade e numa velocidade em certo sentido maiores do que o ocorrido na primeira onda neoliberal (1990-2002).

Neste contexto, o Partido dos Trabalhadores está convocado a retomar e atualizar as diretrizes estratégicas e programáticas afirmadas por nosso 5º Encontro Nacional (1987): articular luta pelo governo e luta pelo poder; articular luta social, luta institucional, luta cultural e organização; articular a luta por políticas públicas, reformas estruturais e socialismo.

Chegamos à presidência da República em 1 de janeiro de 2003 e dela fomos definitivamente afastados em 31 de agosto de 2016. Mas precisamos ter clara a diferença entre governo e poder. O máximo que a esquerda e a classe trabalhadora brasileira conquistaram foi o governo nacional, e mesmo assim com muitas limitações. O poder continuou concentrado em mãos da mesma classe social: o grande empresariado capitalista. Sabendo disto, devemos deixar claro que disputar eleições e conquistar governos continua sendo necessário, mas as chances de êxito serão maiores ou menores, a depender das forças que a classe trabalhadora acumule nos demais espaços e instituições onde se trava a luta e o exercício do poder: judiciário, burocracia de Estado, segurança pública e defesa, controle da economia, meios de comunicação, educação e cultura, auto-organização do povo.

Hoje, a classe dominante brasileira busca implementar um conjunto de medidas estruturais que visam impedir que a esquerda brasileira possa voltar a governar o país. Isto inclui a interdição do PT e o parlamentarismo, mas também inclui alterações na Constituição que, se efetivadas, impedirão que um eventual governo de esquerda tenha meios institucionais para fazer não apenas mudanças, mas até mesmo políticas públicas voltadas às maiorias populares.

Sendo assim, há duas alternativas possíveis para uma esquerda que deseja ganhar eleições e governar o Brasil: ou aceitar as limitações; ou criar as condições para subverter estas limitações e tornar possível o que hoje pode parecer impossível de fazer. Frente a esta disjuntiva, o PT reafirma que seu objetivo permanente é transformar profundamente as condições de vida da classe trabalhadora e da maioria explorada do povo brasileiro. Portanto, ao chegarmos novamente ao governo, começaremos de imediato a transformar as condições de vida da classe trabalhadora ainda nos marcos do capitalismo. Mas como nosso objetivo é transformar profundamente as condições de vida da classe trabalhadora, se fará necessário superar o capitalismo através da construção do socialismo.

Construir o socialismo exige que a classe trabalhadora construa – ela própria — a consciência, a organização, a capacidade de mobilização e o poder político que se fazem necessários para derrotar a classe que hoje domina a sociedade brasileira e seus aliados internacionais. E isto só ocorrerá se, desde já, formos capazes de apresentar e construir alternativas de tipo socialista para os problemas do cotidiano. Se a esquerda pretende de fato construir o socialismo, ela precisa desde já convencer a maioria da classe trabalhadora e do povo de que as soluções que apresentamos para os problemas do cotidiano são superiores àquelas orientadas por uma lógica capitalista, visam um horizonte mais amplo que o imediato.

Para tanto, o programa do PT deve abordar os temas do bem-estar social, da democracia e da soberania nacional e sintetizar as mudanças estruturais que queremos fazer no Brasil em benefício da classe trabalhadora e da maioria do povo brasileiro; uma abordagem e mudanças que devem ser vertebradas pelos interesses da maioria e não da minoria; pelo bem-estar e não pelo lucro; pelo público e não pelo privado; pelo Estado e não pelo mercado; pelo social e não pelo individualismo; por um horizonte socialista e não capitalista. O programa do Partido aponta um conjunto de transformações que, partindo da realidade atual, levando em conta a correlação de forças e o nível de consciência do povo, acumula forças desde já num sentido socialista. Afinal, a classe trabalhadora produz as riquezas do Brasil. Portanto, ela tem o direito de decidir o que produzir, como produzir e como distribuir a riqueza gerada por ela. Nosso Partido está comprometido com melhorar a vida do povo aqui e agora; e o fazemos desde já na perspectiva de ir muito além disto: queremos transformar tão profundamente as condições de vida da classe trabalhadora, da maioria do povo brasileiro, que consideramos necessário superar o capitalismo e construir o socialismo. Por isto não nos contentamos em “administrar o capitalismo”.

Desde 1983 até hoje, no terreno municipal, estadual e nacional, acumulamos uma rica experiência em termos de políticas públicas que resultaram em melhoria na capacidade produtiva do país e nas condições de vida do povo, no terreno material, cultural e político, por exemplo em áreas como a educação, saúde, cultura, esporte, transporte, habitação, energia, água, saneamento, emprego e distribuição de renda. Vistas de conjunto, estas políticas públicas tiveram contra si: a) um orçamento limitado, b) um crescimento econômico insuficiente e instável; c) uma estrutura econômica e social concentradora de renda e riqueza, além de estruturas de poder geralmente conservadoras, em âmbito nacional e mundial. Além disso, há que considerar os efeitos da crise internacional do capitalismo, que vem desde 2008.

Um caso que deixa isto muito claro é o do sistema único de saúde (SUS), criado pela Constituição de 1988. O SUS sempre foi subfinanciado. Seus efeitos positivos foram sempre parcialmente neutralizados ou anulados pela dinâmica econômica. Ademais, uma parte do investimento público no SUS sempre foi capturada pelo setor privado. Em decorrência disto, uma excelente política pública não consegue produzir todos os efeitos sistêmicos de que é potencialmente capaz. Situação que a direita manipula em favor da privatização, do mercado de “planos de saúde” e das tentativas de criar um “SUS-para-pobres”, no lugar de uma política universal. Raciocínio similar pode ser feito no terreno das políticas de habitação popular, encarecidas pela especulação imobiliária e pela atitude das construtoras; ou no terreno das políticas de fomento à produção de alimentos, que sofrem a concorrência do agronegócio de exportação.

Portanto, seja para tornar realmente universais as políticas públicas, seja para evitar que os efeitos positivos destas políticas sejam neutralizados pelas estruturas conservadoras ou por crescimentos insuficientes e/ou instáveis, é necessário combinar políticas públicas com reformas estruturais: políticas que alteram a distribuição da riqueza e do poder entre as classes sociais. Entre estas reformas estruturais, citamos:

A reforma tributária, que inclui medidas como a tributação de juros sobre capital próprio; a tributação sobre lucros e dividendos; a taxação sobre remessa de lucros e dividendos ao exterior; a extensão do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) para barcos e aviões; a adoção de Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF); a revisão da tabela do imposto de renda sobre pessoas físicas, com aumento do piso de isenção e ampliação progressiva das faixas de contribuição; o aumento do imposto sobre doações e grandes heranças, com repactuação do valor arrecadado entre União, estados e municípios.

A reforma financeira, que inclui medidas como a auditoria e redução do serviço da dívida, juros compatíveis com crescimento e geração de empregos, lei antitruste financeiro, eliminação dos monopólios nacionais privados, fortalecimento dos bancos públicos, cooperativos e regionais, a autonomia do Banco Central frente ao oligopólio financeiro.

A reforma agrária, que inclui medidas como a adoção de regime progressivo para o Imposto Territorial Rural para propriedades improdutivas; a redefinição dos índices de produtividade para fins de reforma agrária; a proibição da venda de terras para estrangeiros; o estabelecimento de limites regionais para a propriedade agrária e o agronegócio; o fortalecimento da agricultura familiar e das cooperativas agroindustriais como vertentes principais para a conquista de autossuficiência e soberania alimentar; a defesa dos direitos e heranças dos povos originários; a aprovação de um novo código de proteção ambiental.

A soberania energética, que inclui medidas como a recomposição do regime de partilha, com a participação obrigatória da Petrobras nas explorações do pré-sal; a criação do Sistema Nacional de Energia, com o controle estatal sobre todas as distintas empresas do setor. Retomada do modelo de partilha do pré-sal e uma Petrobrás 100% a serviço dos interesses públicos.

A constituição de um estado de bem-estar social, através da ampliação dos direitos sociais, trabalhistas e previdenciários, incluindo medidas como a revogação da PEC 55/EC 95 e de outras medidas adotadas pelo governo golpista que assumiu depois de 31 de agosto de 2016; o reestabelecimento do comprometimento constitucional mínimo com saúde e educação; a aprovação da Consolidação de Leis Sociais, constitucionalizando o direito à renda mínima e outros benefícios; a constitucionalização da lei de valorização do salário mínimo; a redução da jornada semanal de trabalho para 40 horas (medida que além de tudo contribuirá para a geração de empregos).

A reforma política, que inclui a adoção do voto em lista partidária, a proibição de coligações proporcionais, a criação de federações partidárias, o financiamento público das campanhas eleitorais, o autofinanciamento dos partidos políticos, a possibilidade de referendo revogatório para cargos executivos (substituindo o mecanismo do impeachment), a possibilidade de convocação, pelo presidente da República ou por 10% do eleitorado, de plebiscitos impositivos.

A democratização da mídia, que inclui medidas como: a proibição de propriedade cruzada e de propriedade de meios por parlamentares, governantes ou familiares até segundo grau; a criação de um Fundo em Defesa da Liberdade de Imprensa, com um percentual da receita publicitária das televisões aberta e fechada, além das rádios, para estimular novos meios de comunicação; a cláusula de objeção por consciência em todas as redações; a criação de um Conselho Social de Comunicação, que autoriza e renova licenças para emissoras de rádio e TV, retirando essa prerrogativa do parlamento; a criação do direito gratuito de antena na TV aberta e nas rádios.

A reforma do sistema de justiça e segurança, que inclui medidas como a instituição de mandatos limitados para ministros da Suprema Corte, do STJ, do TST e desembargadores dos TRFs e TJs; a democratização dos mecanismos de escolha para os tribunais; a desmilitarização das PMs estaduais e unificação com a polícia judiciária; a reformulação do Sistema Nacional Penitenciário, com a incorporação de todas as prisões e casas de detenção a um modelo único de gestão.

O fortalecimento do papel do Estado como financiador, indutor, regulador, planejador e – através das empresas estatais — executor direto. Ao Estado cabe coordenar e/ou executar um conjunto de medidas que tornem possível a ampliação do nível cultural, científico, tecnológico e da produtividade de toda a sociedade brasileira; integrando o local, o estadual, o nacional, o continental e o mundial; possibilitando economia de escala, articulando cadeias produtivas e garantindo retaguarda estratégica.

A reindustrialização nacional, combinando ampliação do mercado de massa de bens de consumo privado; ampliação do acesso a bens públicos como saúde, educação, cultura, habitação e transporte; e políticas de desenvolvimento regional e integração continental. Reconstrução de uma indústria forte e tecnologicamente avançada, liberta dos monopólios e oligopólios privados. Forte participação estatal no financiamento, na produção, na pesquisa e na formação de quadros, especialmente de cientistas e engenheiros. Regular a iniciativa privada, em favor de um plano de desenvolvimento que beneficie a maioria do povo, com taxas de crescimento compatíveis com a absorção dos desempregados e dos que entram a cada ano no mercado de trabalho.

Imensa ampliação da participação e da auto-organização da classe trabalhadora, conquistando maioria nos parlamentos e governos, exercendo as liberdades democráticas, desenvolvendo uma ativa política de comunicação, construindo outro tipo de política e de Estado, outra política de segurança pública e de Defesa, outra política de educação e cultura, e implementando uma luta sem tréguas contra a corrupção. Criar as condições para a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

O programa do PT, conforme resumido acima, visa implementar um desenvolvimentismo democrático, popular e socialista ambientalmente orientado, centrado na soberania alimentar e sobre nossos recursos naturais; na sustentabilidade, preservando as florestas, a biodiversidade, as fontes de água; e na produção do espaço social, incorporando os serviços ambientais no planejamento das cidades e na reforma urbana. Melhorar as condições de vida do povo brasileiro, de maneira profunda, acelerada e sustentável, exige superar o controle que os capitalistas mantêm sobre nossa sociedade, a começar por nossa economia. Queremos voltar a elevar, de maneira acelerada e sustentável, todos os indicadores sociais, naturais e individuais. Não queremos ser um país de classe média. Queremos ser um país onde a classe trabalhadora tenha altos níveis de vida material, cultural e política. Será necessário tempo, muito esforço, muita criatividade e muita luta para atingir estes objetivos. Tarefas que estão postas desde agora, no enfrentamento do governo golpista.

Um programa de emergência

O Partido dos Trabalhadores luta pelo socialismo e por reformas estruturais. Ao mesmo tempo, apresenta um programa de emergência, destinado a enfrentar e superar no curto prazo a caótica situação econômica e social criada pelos golpistas, assim como destinado a criar as condições para enfrentar os grandes problemas políticos do presente e do futuro imediato. Este programa de emergência, articulado com o programa de reformas estruturais detalhado anteriormente, inclui dentre outras medidas:

- Revogação da Emenda Constitucional 95 (que limita o crescimento dos gastos públicos por vinte anos), da Lei 4567/16 (que desobriga a Petrobras de ser operadora em todos os blocos do pré-sal) e de todas as medidas de caráter antipopular, antinacional e antidemocrático aprovadas durante o governo usurpador.

- Recriação do MDA, prioridade para a agricultura familiar e distribuição de terras para trabalhadores acampados. Proibição da venda de qualquer bem da natureza ao capital estrangeiro. Retomada da política externa independente, altiva e soberana.

- Criação de um Fundo Nacional de Desenvolvimento e Emprego – financiado pelo uso parcial das reservas internacionais, pela queda das despesas financeiras e pela reorganização do sistema nacional de impostos – que destine 100 bilhões anuais para obras de infraestrutura, saneamento, habitação, renovação energética e mobilidade urbana. Reorganização do Programa Minha Casa, Minha Vida, com expansão da construção de moradias populares e um plano de financiamento a longo prazo para reformas e melhorias residenciais. Expansão e barateamento do crédito para produção e consumo, em movimento comandado pelos bancos públicos e lastreado pela redução dos depósitos compulsórios. Reajuste de 20% do Bolsa Família, entre outras medidas de expansão dos gastos sociais.

- Recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), estabelecendo arrecadação compartilhada com estados e municípios. Tributação de juros sobre capital próprio, com a revogação do benefício fiscal previsto na lei 9249/1995, que permite a dedução de despesas financeiras da base de cálculo tributário das empresas, por conta de créditos aportados pelos próprios acionistas. Tributação sobre lucros e dividendos, eliminando isenção de Imposto de Renda sobre pessoas físicas e jurídicas, também prevista pela lei 9249/1995, na declaração de benefícios auferidos por suas participações acionárias. Adoção de regime progressivo para o Imposto Territorial Rural sobre propriedades improdutivas. Extensão do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) para barcos e aviões. Adoção do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), com alíquota anual variável entre 0,5% e 1% sobre os detentores de patrimônio líquido superior a oito mil vezes o limite de isenção previsto no Imposto de Renda para Pessoa Física do período arrecadatório. Revisão da tabela do imposto de renda sobre pessoas físicas, com aumento do piso de isenção e ampliação progressiva das faixas de contribuição. Aumento do imposto sobre doações e grandes heranças, com repactuação do valor arrecadado entre União, estados e municípios. Fim da isenção de contribuição previdenciária dos exportadores agrícolas e das entidades filantrópicas que cobram por prestação de serviços. Revisão da Lei Kandir, com adoção de regras tributárias que gravem a exportação de bens e serviços.

- Realização de plebiscito para convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte livre, democrática e soberana. Reforma política. Democratização da mídia, com adoção de legislação que proíba a propriedade monopolista de meios e expanda as oportunidades de expressão para todos os setores sociais.

Uma tática para resistir e voltar à ofensiva

A tarefa número 1 do PT e de qualquer pessoa ou organização de esquerda é participar da defesa dos direitos do povo e da luta contra o governo golpista; denunciar o golpe e chamar o Fora Temer; fazer dura oposição ao governo usurpador; defender as liberdades democráticas e os direitos sociais  da classe trabalhadora, da juventude, das mulheres; lutar contra o racismo, contra a LGBTfobia, em defesa dos indígenas e dos direitos humanos. O êxito nesta luta está diretamente vinculado ao grau de unidade das forças democráticas, populares e de esquerda. A Frente Brasil Popular (FBP) deve ser fortalecida e ampliada, assim como deve seguir cooperando com iniciativas como a Frente Povo Sem Medo.

A partir da Frente Brasil Popular, devemos construir uma frente mais ampla, em defesa das liberdades democráticas, da soberania nacional e do desenvolvimento. Mas não se deve confundir a necessidade de atrair forças de centro, com o erro de subordinar a esquerda ao centro.

A construção da FBP faz parte do esforço para construir uma coligação eleitoral que dispute as eleições de 2018. Estas iniciativas devem convergir, mas para isso é preciso diferenciar o que é uma frente política e social para fazer lutas do que são coligações eleitorais. A confusão entre uma e outra, bem como a subordinação do social ao eleitoral, são erros que não devem se repetir.

A cada ataque contra Lula, mais se torna evidente que as forças golpistas querem impedir que o PT dispute com chances de vitória a presidência da República. Os golpistas temem que Lula possa vencer as eleições. O PT se empenhará para viabilizar a candidatura de Lula e para que ela seja adotada por outros partidos e setores democráticos, populares e socialistas. Parte importante deste empenho passa por envolver, desde o início, o maior número possível de partidos, movimentos e personalidades engajados na luta contra o golpismo, na construção da plataforma programática que será defendida nas eleições de 2018.

As eleições de 2018 são uma batalha fundamental. Para os golpistas, será a chance de conseguir o que não conseguiram em 2014. Para os setores progressistas, será o momento de reafirmar as liberdades ameaçadas. Para os setores de esquerda, será o momento de retomar o governo e a perspectiva de transformação do Brasil. Para o PT, será também a oportunidade de apresentar seu balanço e suas propostas.

Mas as eleições de 2018 são uma batalha, não são toda a “guerra”. Para vencê-la, será preciso muito mais do que ações de natureza eleitoral, é necessário acumular forças no terreno social, cultural e organizativo e apresentar um programa de governo e uma estratégia para 2019-2022 superiores àquilo que fizemos entre 2003 e o impeachment.

Devemos superar a política de conciliação de classes; a convivência com os oligopólios, especialmente o financeiro e o agroexportador; a tolerância frente à indústria da comunicação, da educação e da cultura; as ilusões republicanas acerca das instituições de Estado, a começar pelo judiciário, forças armadas, ministério público e polícia federal; o discurso sobre o “país de classe média”; as vacilações no enfrentamento da meritocracia, do consumismo, do ataque às minorias; a ausência de debate ideológico. Mais do que nunca devemos lembrar que, para transformar, é preciso realizar rupturas com as estruturas de poder e propriedade.

As eleições de 2018 são diferentes das que ocorreram entre 1989 e 2002. Além da possibilidade de derrota eleitoral, é preciso levar em conta que tentarão impedir que disputemos, vençamos, tomemos posse e governemos. Por tudo isto, nossa tática em geral e nossa tática eleitoral em particular, bem como nossa política de alianças, devem estar totalmente subordinadas à nossa estratégia, que tem como aspecto central reconquistar a confiança da maioria da classe trabalhadora brasileira, não apenas no PT, mas no conjunto das organizações da classe. Em suma: nosso Partido deve ser capaz de obter vitórias táticas, mas ao mesmo tempo deve construir vitórias estratégicas.

A retificação de nosso Partido

O desafio destes 37 anos de PT foi o de construir um partido de esquerda, socialista, democrático, de massas, enraizado na classe trabalhadora, com vocação de governo e de poder.

Obtivemos importantes êxitos desde 1980. Vencer quatro eleições presidenciais seguidas não foi um acidente, foi produto de um acúmulo de forças importante, construído não apenas pelo PT, mas pelo conjunto da classe trabalhadora. Também por isto, não aceitamos a postura daqueles que subestimam e minimizam aquilo que foi conquistado desde 2003 em favor da classe trabalhadora.

Mas a quase derrota nas presidenciais de 2014, o impeachment de 2016, o massacre que sofremos nas eleições municipais de 2016, o caráter estruturalmente limitado de nossas políticas de governo e, principalmente, a perda de apoio na classe trabalhadora, revelam nossas limitações e erros – que não são apenas do PT, mas de um conjunto de organizações da classe trabalhadora e da esquerda brasileira, que também estão chamadas a rever sua estratégia e sua conduta organizativa.

O principal destes erros foi, como já dissemos, a conciliação de classes, a crença de que seria possível melhorar a vida do povo sem impor profundas derrotas à classe dominante.  Em decorrência, ocorreu uma adaptação do PT às instituições que deveríamos transformar, bem como uma acomodação a certos hábitos da direita. Ao contrário de antecipar, nas suas práticas e valores, as características do futuro que queremos construir, parcelas crescentes do PT foram se adaptando às tradições do passado e do presente. Uma conduta que devemos reverter, um erro que não podemos repetir.

O PT e a luta contra a “conciliação”

As classes dominantes brasileiras sempre foram excludentes e violentas no trato com as demais. Mas no relacionamento entre as diversas frações da classe dominante, geralmente predominou a conciliação e o pacto das elites.

Quando o PT chegou ao governo nacional, em 2003, a orientação predominante no Partido era caracterizada pela moderação programática e política, bem como por uma aliança com setores capitalistas, sendo importante lembrar que tal aliança incorporou inclusive o capital financeiro, transnacional e agropecuário.

Por certo período, grande parte do PT apoiou esta aliança, movido pela crença de que seria possível transformar estruturalmente o Brasil sem enfrentar e sem impor derrotas estratégicas à classe dominante e ao capitalismo, e movido pela convicção de que seria impossível manter o governo sem fazer alianças e concessões à classe dominante. Além disso, acreditava-se que ao ser moderado, o PT estimularia a moderação da classe dominante, na ilusão de que seria possível humanizar o capitalismo e domesticar os capitalistas.

Durante algum tempo, esta aliança não impediu e em certa medida até contribuiu para alguns avanços econômicos e sociais. Mas sempre se tratou de uma aliança unilateral. Em nenhum momento a classe dominante e seus representantes deixaram de atacar nosso governo e a esquerda, sabotando nossas políticas e preparando o contra-ataque, que teve início a partir do primeiro mandato da presidenta Dilma Rousseff.

Diante da tentativa de reduzir a taxa de juros e da lei da partilha do pré-sal, setores fundamentais da classe dominante decidiram dar um basta à experiência governamental petista. E quando isto aconteceu, a estratégia da conciliação mostrou todos os seus limites: não apenas foi tímida em realizar mudanças, como foi incapaz de nos preparar para o momento da contraofensiva reacionária. Apesar disto, alguns setores do nosso Partido e da esquerda se mantiveram prisioneiros da velha estratégia. Exemplos disto são a política de subsídios e isenções realizadas pelo governo Dilma, a postura frente à Operação Lava Jato, o debate sobre a Lei anti-terrorismo, a continuidade da publicidade na mídia golpista, a tática de campanha e as alianças com partidos golpistas nas eleições municipais de 2016, a postura de parte das bancadas do PT na eleição das mesas diretoras da Câmara dos Deputados, do Senado e de várias assembleias legislativas e câmaras municipais em todo o Brasil.

Um dos temas onde fica claro o tamanho do dano causado ao PT, pela conciliação e pela adaptação, é a maneira como o Partido enfrentou o tema da corrupção, tanto na sua ação governamental e parlamentar, quanto no seu funcionamento interno.

O PT na luta contra a corrupção

Há vários anos o Partido dos Trabalhadores vem sendo atacado duramente, acusado de ser uma “organização criminosa”, cujas lideranças, integrantes e apoiadores deveriam ser perseguidos e execrados publicamente, julgados e condenados. Para alguns, o próprio PT deveria ser proibido de existir. A cobertura televisiva do julgamento do chamado “mensalão” e dos atos contra o governo da presidenta Dilma Rousseff, a overdose da Operação Lava-Jato e o linchamento midiático diário do presidente Lula têm este propósito.

Frente a esta operação, que nunca foi clandestina nem sutil, nosso Partido adotou uma política geralmente confusa, defensiva e essencialmente incorreta, como é demonstrado pelo desgaste que sofremos junto à grande parte de nossa própria base social e eleitoral. O tema da corrupção tornou-se parte importante dos motivos que fizeram o PT e suas lideranças perderem parte significativa do apoio que tinham.

Parte importante de nossa militância, mesmo recusando os ataques feitos pela direita, considera que o PT cometeu erros gravíssimos, que precisam ser reconhecidos, diagnosticados e tratados. Alguns desses erros seriam de responsabilidade também coletiva, entre os quais o de termos “baixado a guarda” contra as armadilhas de um sistema político-eleitoral que desde sempre serviu às classes dominantes. Outros erros seriam individuais, de maior ou menor gravidade, devendo ser assumidos como de exclusiva responsabilidade pessoal.

Já nos anos 1980 o PT denunciava o financiamento empresarial das campanhas eleitorais e dos próprios partidos como algo antidemocrático e corrupto. E por muitos anos nosso Partido foi conhecido por enfatizar políticas que visavam eliminar a influência do poder econômico sobre as liberdades democráticas.

Nos anos 1990, o PT passou a enfatizar em suas resoluções o tema da “ética na política”. Mas ao mesmo tempo, paradoxalmente, foi também nos anos 1990 que o PT relaxou nos seus mecanismos de autofinanciamento, passando a depender cada vez mais do financiamento público e do financiamento empresarial, num processo de adaptação que afetou o conjunto do PT, mesmo que tenha sido mais pronunciado em alguns setores do que em outros.

Alguns acreditavam que era possível manter-se imune àquela engrenagem corrupta e corruptora do financiamento empresarial privado; e/ou que poderiam utilizá-la a serviço de outros propósitos, que não os da manutenção dos interesses do grande capital financiador; e/ou que não haveria outra alternativa, sob pena de perdermos as eleições para os que dispunham do financiamento empresarial; e/ou que bastaria seguir a lei, como se o problema estivesse no “caixa 2” e não no financiamento privado empresarial em si.

Em 2005, quando a direita fez no chamado mensalão o “ensaio geral” da Operação Lava Jato, nosso o Partido cometeu quatro erros fundamentais: 1) manteve e aprofundou a dependência frente ao financiamento privado empresarial; 2) não converteu a luta pela reforma política em aspecto central da nossa linha política; 3) deixou a investigação e o julgamento totalmente nas mãos da polícia, do ministério público e do judiciário, não formando uma opinião própria, do Partido, acerca dos fatos e dos casos sob julgamento; 4) não criou uma corregedoria interna, que tivesse como tarefa agir preventivamente frente a casos de corrupção.

O fato de termos sobrevivido à crise de 2005 e vencido as eleições de 2006, 2010 e 2014 fortaleceu em amplos setores do Partido a impressão de que não era necessário adotar medidas que tornassem o financiamento da atividade partidária algo independente tanto do empresariado, quanto do fundo público.

Apesar das autocríticas parciais feitas posteriormente, inclusive em resoluções congressuais, o fato é que o Partido aprofundou a dependência frente às contribuições empresariais privadas, sem nem ao menos adotar mecanismos de autodefesa, crendo piamente na imparcialidade das “instituições republicanas” e parecendo acreditar que a legalidade formal do financiamento empresarial nos deixaria livres de qualquer suspeita de corrupção.

Além disso, mesmo estando a frente do Governo Federal, pouco ou nada fizemos para democratizar o judiciário. Não aumentamos o controle social sobre o poder mais obscuro da República. Pelo contrário, legitimamos sua autonomia, assim como do ministério público e da polícia federal.

Aliás, muitos setores do PT e do governo viam a Operação Lava-Jato como cheia de nobres intenções republicanas. Diante das provas crescentes do contrário, no máximo admitiam que a Operação poderia estar sendo “manipulada” para incriminar petistas e levar Dilma à derrota. Não percebiam e não denunciavam que a essência da Operação Lava Jato era a destruição do PT, a derrubada do governo e a interdição de Lula.

Os fatos, entretanto, demonstraram que a Operação Lava-Jato é, desde sua gênese, uma ação de cerco e aniquilamento combinada – não necessariamente pactuada previamente – entre a mídia, setores do ministério público, da polícia federal e da justiça federal. Diante da impossibilidade de um golpe de velho tipo, mas temendo nova derrota em 2018, a tática implementada foi a do golpe de novo tipo: estimular a mobilização de massas, tendo a “luta contra a corrupção” como a principal bandeira a mobilizar principalmente os setores médios e neutralizar os setores populares.

O golpe do impeachment foi perpetrado por uma quadrilha de corruptos. Quanto mais aparecem novos casos de corrupção e o envolvimento de políticos de direita, quanto mais fica evidente o caráter sistêmico da corrupção e que o processo vem dos anos 1990, quanto mais ficam claros os vínculos com a privataria tucana, mais histérico é o empenho da mídia e dos setores repressivos do Estado para acusar seletivamente o PT e tentar impedir a candidatura presidencial de Lula.

O Partido dos Trabalhadores questiona a legalidade e a legitimidade dos processos desenvolvidos pela Operação Lava Jato e outros semelhantes. Nosso questionamento não implica em absolver criminosos comprovados. Aliás, é exatamente o contrário: em nome de tentar culpar o PT, criminosos confessos já estão sendo beneficiados pela Operação Lava Jato.

A direita é hipócrita, aplicando dois pesos e duas medidas: o “mensalão” do PT foi julgado, o “mensalão” tucano não foi; a corrupção na Petrobrás é escândalo midiático, a corrupção que envolve o Metrô e as ferrovias de São Paulo é nota de rodapé; a contribuição de empreiteiras para o PSDB é tida como legal, a contribuição das mesmas empreiteiras para o PT é criminalizada.

O PT não é hipócrita. Reconhecemos que foi um erro adotar, mesmo que em menor escala, mesmo que para eleger governos e parlamentares populares, métodos de financiamento eleitoral similares aos da direita. Além disso, reconhecemos que o uso do cachimbo faz a boca torta: ao usar alguns dos métodos da classe dominante, facilitamos desvios no comportamento do Partido  — inclusive nos processos eleitorais internos ao partido — que agora precisam ser corrigidos. Damos como exemplo de um passo nesse sentido a decisão de não receber mais recursos empresariais, adotada antes mesmo que houvesse decisão oficial do Judiciário a respeito.

Entretanto, isto não basta. O 6º Congresso do Partido adota, também, as seguintes medidas:

a) iniciar a reconstrução dos mecanismos de autofinanciamento do Partido pelas suas bases militantes, sociais e eleitorais, tornando novamente obrigatória a contribuição financeira por parte de todos os nossos filiados e filiadas;

b) retomada das propostas e das práticas de luta contra os privilégios, exigindo dos militantes que ocupam postos de direção em governos, parlamentos, movimentos sociais e no Partido que sejam os primeiros a dar o exemplo;

c) combinar a defesa dos acordos de leniência que preservam as empresas e os empregos, com a defesa do cumprimento da lei no julgamento dos proprietários e altos funcionários das grandes empresas que estão na base da economia política da corrupção;

d) questionar a legalidade e a legitimidade dos processos desenvolvidos pela Operação Lava Jato e outros semelhantes, mas sem nenhuma tolerância com criminosos confessos.

e) avaliar segundo critérios do Partido a situação dos filiados que foram acusados e/ou condenados sob acusação de corrupção.

Em 2005, a maioria do Diretório Nacional preferiu não acionar a comissão de ética para as pessoas acusadas. Alguns dos argumentos utilizados foram que isto seria pré-julgamento; que as pessoas poderiam ser forçadas a criar provas contra si mesmas; que deveríamos aguardar os procedimentos do judiciário. Muitas pessoas pareciam acreditar que haveria julgamento justo; que o caixa dois não seria tratado ilegalmente como lavagem de dinheiro; que as contribuições legais, quando feitas ao PT, não seriam consideradas corrupção disfarçada. Na prática, o PT abriu mão de formar um juízo próprio, partidário, sobre o conjunto da obra e sobre cada um dos acusados. O terreno ficou livre para que a polícia, o judiciário e o PIG atuassem. Sabemos qual foi o resultado disto: ao não separarmos o joio do trigo, ao não distinguirmos os erros individuais dos coletivos, facilitamos as manobras e mentiras da Operação Lava Jato.

O 6º Congresso deve, portanto, autorizar o novo Diretório Nacional a constituir uma comissão, composta por personalidades democráticas, progressistas e de esquerda do Brasil e de todo o mundo, para analisar todos os casos de filiados petistas acusados pela Operação Lava Jato e conexas. O relatório final desta comissão deve ser submetido ao Partido e posteriormente difundido publicamente, cumprindo assim as funções de um “tribunal de honra” que permitirá um desagravo àqueles militantes que foram injustamente acusados e/ou condenados.

O sexto congresso deve, também, constituir uma Corregedoria interna permanente. Como qualquer partido, o PT está sujeito a ter nas suas fileiras pessoas que cedem à corrupção. Mas, diferente de certos partidos, o PT se antecipará em identificar e punir quem o faça. Entre outros motivos, porque a corrupção é antagônica ao nosso projeto de sociedade.

É preciso mudar o PT

Ao longo das últimas décadas, o PT cresceu e mudou diversas vezes. Algumas destas mudanças revelaram-se prejudiciais, dificultando a continuidade de nosso crescimento, prejudicando a defesa de nossas conquistas, nos afastando de nossas bases sociais e de nossos objetivos de longo prazo.

É preciso mudar o PT, reconectando nosso funcionamento interno e nossa ação externa com nossa classe e com nossos objetivos históricos, possibilitando uma defesa eficaz de nosso legado e de nossa existência, permitindo que voltemos a crescer.

Uma destas mudanças implica em libertar o Partido do eleitoralismo, tanto da lógica que hipertrofia a dimensão eleitoral frente às outras dimensões da ação partidária; quanto dos interesses particulares de quem tenta fazer do Partido uma escada para “carreiras” e “projetos” individuais ou de grupos, prática que inclui fortalecer as bancadas e mandatos em detrimento das instâncias dirigentes; indicar assessores parlamentares para preencher vagas em diretórios e executivas, não com o objetivo de dirigir o Partido, mas sim de representar os interesses deste ou daquele mandato; perpetuar hábitos tradicionais na relação entre partido, parlamentares e governos; naturalizar o recurso a “cabos eleitorais”; converter a estrutura partidária em um cartório sem vida democrática real, afastando a militância, atraindo oportunistas e reproduzindo internamente os mecanismos de dominação a partir do poder econômico. A experiência dos últimos anos confirmou algo que nosso Partido dizia já nos anos 1980: para os trabalhadores, os parlamentos não são nem devem ser espaço privilegiado.

Precisamos mudar o Partido, um partido dos trabalhadores e das trabalhadoras, baseado numa militância que discuta, decida e se engaje nas lutas das fábricas, dos bairros, dos campos e das escolas; um partido dirigido pelas suas bases e direções, não por gabinetes executivos e legislativos. Um partido cujos parlamentares sejam antes de mais nada tribunos populares, comprometidos com a defesa dos interesses dos trabalhadores, combatentes contra os privilégios e contra qualquer forma de oligarquização da política. Para isto, entre outras medidas que são necessárias, apontamos as que seguem.

O Partido dos Trabalhadores reafirma seu caráter de classe e de massas. Mas para sermos efetivamente o partido da classe trabalhadora, é fundamental manter uma relação permanente e orgânica com a juventude trabalhadora, as mulheres trabalhadoras, os negros e as negras trabalhadoras, com todos os setores populares. Ser um partido integrado à vida cotidiana da classe trabalhadora supõe que todos os nossos filiados e filiadas integrem núcleos por local de trabalho, estudo e moradia. Neste mesmo sentido, o PT formará uma juventude de massas autônoma.

O Partido dos Trabalhadores reafirma seu caráter revolucionário, democrático-popular, socialista e internacionalista, de combate contra o racismo, o machismo, a LGBTfobia e toda e qualquer forma de preconceito, opressão e exploração. Para isto, devemos adotar medidas práticas que permitam aprofundar nossa formação política e ideológica, retomando o fio da elaboração petista dos anos 1980, que buscava superar determinadas tradições e influências da sociedade brasileira, de tipo neoliberal e liberal, socialdemocrata e desenvolvimentista, keynesiana e nacionalista. A Fundação Perseu Abramo e nossa Escola de Formação devem ser reorganizadas nesta perspectiva: formular e difundir o petismo.

O Partido dos Trabalhadores reafirma ser, ao mesmo tempo, organização e movimento: um partido político organizado e um movimento de rebeldia político-cultural. Não se disputa o poder sem construir uma cultura distinta daquela do poder. Para isto, são necessários instrumentos e práticas permanentes de comunicação de massa, educação e cultura. A começar por sedes partidárias que sejam, também, verdadeiros pontos de cultura. E uma ação cotidiana voltada à politização da população: esta tarefa cabe aos movimentos sociais, aos sindicatos, as organizações comprometidas com a educação popular de base, mas também cabe ao Partido, especialmente aos seus núcleos, setoriais e diretórios municipais. Contribuirá nesta perspectiva a criação de uma rede de comunicação própria – integrando revista, jornal, rádio, TV, portal e agência de notícias, articulando-se com outras iniciativas do campo democrático-popular. Converterá suas sedes em “casas do povo”. E organizará festivais culturais anuais, de caráter municipal, estadual e nacional.

O Partido dos Trabalhadores reafirma seu caráter laico, ao tempo que acolhe militantes engajados numa tradição ecumênica e de diálogo inter-religioso. A contraofensiva reacionária manipula de maneira grotesca a religiosidade popular, colocando em questão o Estado laico e estimulando o fundamentalismo. Neste sentido, o PT desenvolverá, de maneira permanente, um diálogo com as bases populares que hoje estão sob influência do neopentecostalismo e da teologia da prosperidade.

O Partido dos Trabalhadores reafirma seu compromisso com uma vida interna democrática. Neste sentido, mantém a paridade, as cotas de juventude e étnica, a proporcionalidade na composição das direções, o direito de tendências. Mas organizar-se em tendências deve ser um direito, não uma obrigação. Para isto, as instâncias partidárias devem ter vida permanente, a comunicação interna e a formação política devem ser acessíveis ao conjunto dos filiados, as finanças partidárias devem estar sob controle coletivo e o processo de eleição das direções – que deve ser integralmente congressual, em reuniões presenciais — deve ter regras que facilitem a eleição de militantes que não fazem parte de tendências.

O Partido dos Trabalhadores reafirma sua disposição de construir, com o conjunto da esquerda política e social, todo tipo de unidade na luta. O PT continua a ser o maior partido da esquerda, mas os erros que cometemos fazem com que amplos setores da militância democrática, popular e socialista nos olhem com desconfiança, dúvida e inclusive rejeição, o que exige a correção de rumos e a demonstração prática de que aprendemos com nossos erros e sabemos fazer diferente. Neste sentido, o PT reafirma seu engajamento na construção da Frente Brasil Popular.

Nosso partido tem um grande passado, de que nos orgulhamos. Mas não queremos ser um partido que tem um grande passado pela frente. Queremos continuar contribuindo para que a classe trabalhadora e as maiorias populares do Brasil, da América Latina e Caribe, de todo o mundo possam viver em paz, democracia e bem-estar. É para que isso que criamos e continuaremos a construir o Partido dos Trabalhadores: lutar contra o capitalismo e pelo socialismo.

Brasil, junho de 2017, ano do centésimo aniversário da Revolução de Outubro.

Assinam a tese, para fins de registro formal: Bruno Elias, Jandyra Uehara, Adriano Oliveira, Rosana Ramos, Júlio Quadros, Iriny Lopes e Valter Pomar.


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